A estes edifícios religiosos de outras épocas, de outros gostos, opõe-se a construção, em moldes modernos, da emblemática igreja matriz, inspirada “nas antigas basílicas bizantinas, tanto pela grandeza do espaço interior aberto, como pela configuração externa dos anexos e ainda pelo movimento dos telhados em forma ogival, que se entrelaçam e combinam harmoniosamente uns com os outros”.
Dedicada à padroeira da freguesia, Santa Joana, este edifício, mais do que um valor patrimonial, arrebata um particular sentir, dada a sua importância na história da criação da freguesia.
De facto, na génese da união de uma comunidade, até então dispersa por freguesias limítrofes, encontra-se cada pedra que lhe dá forma. Foi sob a égide de Santa Joana que a população delineou uma vontade e a transformou num contemporâneo espaço sagrado.
Projetada pelo conceituado arquiteto portuense, Luís Cunha, e construída de raiz entre 1972 e 1976, a igreja matriz respira, também esteticamente, a vida de Santa Joana.
Nos tímpanos da fachada principal, encontramos, esculpidas na massa de cimento, duas imagens que aludem de forma inequívoca a dois momentos cruciais da vida da princesa: a sua tomada de hábito e o fim da sua vida. O primeiro, reproduzido no tímpano da esquerda, retrata uma comovente cena que se reveste de particular significado, uma vez que assinala a sua renúncia ao mundo principesco, para se entregar a um reino superior: à paixão de Cristo. O relevo dado à tesoura é propositado, simbolizando a mesma o corte com o mundo terreno. O tímpano da direita retrata o pesar da sua morte, manifestado pelo murchar e desfolhar das árvores e flores. Um acontecimento arrepiante, em que a própria natureza quis dar provas da sua dor.
Entre estas duas cenas, surge no centro da fachada a figura central de Cristo, “o Senhor do Universo”, circundado, do lado esquerdo, por uma Mão e, do lado direito, por uma Pomba. Os três elementos a simbolizarem a Santíssima Trindade.
Ainda na parte frontal da igreja matriz, ergue-se, ligeiramente posposta, uma esbelta torre sineira.
No interior, o “espaço sagrado tem na parede do fundo, à direita de quem entra, um grande vitral, em forma de rosácea, de vidros policromados, a iluminar o sacrário, que lhe fica defronte; do lado esquerdo há mais cinco pequenas rosáceas, dispostas em forma de cruz gregal. Os vidros policromados não só não ferem a vista como quebram a austeridade da larga parede de fundo cujo único tratamento foi o assim chamado “chapisco de côdea”.
Uma vez dentro do templo, um políptico, na parede do fundo, alude novamente a Santa Joana. Ao seu mais célebre retrato, colocado no centro, circundam-no outras cenas da sua vida, para além das duas supramencionadas.
Uma delas foca o sonho tido por Santa Joana, através do qual soube que um seu pretendente, Ricardo III de Inglaterra, acabava de morrer numa batalha. “O painel que temos diante dos olhos refere-se ao diálogo entre os dois irmãos qual deles o mais tenaz na sua própria decisão. O sonho da Santa Princesa é representado em ponteado pela figura de um cavaleiro a cair abaixo da sua montada.”
A ria surge no painel de cima, à direita, representando a sua infestação, no século XV, pelas epidemias, mormente a peste, esta ilustrada por umas terríveis garras. Por várias vezes, Santa Joana teve de abandonar Aveiro a mando do pai e dirigir-se para locais saudáveis, contra a sua vontade.
Por último, este políptico retrata ainda a devoção da princesa à paixão de Cristo. As duas mãos a segurar a coroa de espinhos encerram em si toda a grandeza de sentimento desta santa mulher. “A coroa de espinhos era suficiente para evocar todo o drama da Paixão e lembrar aos devotos e admiradores da Santa Princesa que foi em troca desta coroa de espinhos que ela pôs de parte o seu diadema real”.
Todo este cenário que pretende relembrar a cada um dos presentes este extraordinário exemplo de humildade e de completo desapego aos bens materiais em prol de um amor mais puro só ficou completo quando a comunidade de Santa Joana pode acolher a estátua da princesa. Depois de ter permanecido durante vários anos junto ao Museu de Aveiro, e na sequência da realização de obras de requalificação urbanística na mesma zona, a imagem da santa princesa foi transferida para a freguesia que a recebe como padroeira.
A cerimónia de inauguração da imagem ocorreu no dia 4 de novembro de 2001. Depois da missa dominical e de uma oração a Santa Joana, escrita pelo antigo bispo de Aveiro, D. João Evangelista Lima Vidal, o largo fronteiro à casa edificada em seu nome explodiu de alegria aquando do emblemático ato de descerramento. Além de símbolo vivo no coração da comunidade de Santa Joana, tornava-se agora presença corpórea, passível de ser contemplado cada traço do rosto, pronto a ouvir o desabafo íntimo de cada um e a reconfortá-lo com o seu olhar transparente.